O presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Marcos Camargo, participou pela terceira vez de audiência pública na comissão especial que analisa o projeto do novo Código de Processo Penal (CPP). O debate desta 3ª feira (4/5) teve como tema “Prova e Ações de Impugnação”.
Camargo chamou atenção para um conceito adotado por diversos juristas de que a existência de direitos fundamentais expressos não impede a existência de outros, implícitos na própria Constituição. Ele citou como exemplo o direito fundamental à prova, que é, inclusive, objeto de diversos tratados internacionais ratificados pelo Brasil.
“O artigo 5° da Constituição assevera que ninguém será privado da liberdade e de seus bens sem o devido processo legal, dentro do qual é evidente que se encontra o direito à ampla defesa e ao contraditório, com os meios e recursos a eles inerentes. Ou seja, o direito de se trazer ao processo elementos qualificados de prova para se comprovar a veracidade dos fatos”, destacou.
Segundo o presidente da APCF, o capítulo das provas do novo CPP deveria valorizar e ampliar o espaço dado às provas científicas. Contudo, na avaliação dele, o relatório da iniciativa regride nesta questão, praticamente extinguindo a perícia criminal. “Nosso ordenamento jurídico deixa claro que a perícia oficial é imprescindível e que o destino do trabalho dos peritos, o laudo pericial, não é outro senão o processo penal. E isso se dá justamente por se tratar de um trabalho baseado na ciência, dando-lhe um caráter imparcial, isento e equidistante das partes. Essencial à ampla defesa e ao contraditório, capaz tanto de apontar culpados e demonstrar a inocência”, afirmou.
Entre os principais riscos do relatório apresentado pelo deputado João Campos (Republicanos-GO) estão:
- O fim da imprescindibilidade de perícia nos crimes que deixam vestígios (supressão do art. 158 do atual CPP);
- A retirada da nulidade por ausência de perícia (supressão do art 188 do atual CPP);
- A extinção da autonomia funcional dos peritos (art. 237 do novo CPP); e
- O comprometimento do status dos peritos oficiais como auxiliares da justiça (art. 240 no novo CPP).
“Com essa proposta, o exame pericial sequer poderá ser solicitado. E se for, o laudo pericial sequer poderá ser considerado e sequer poderá ser inserido no processo, bastando, para isso, que não se alinhe à uma determinada tese investigativa”, destacou Marcos Camargo. “O que é isso senão o entendimento de que os peritos não são mais auxiliares da justiça, mas sim dos delegados, estando a eles vinculados? O que é isso senão a extinção da perícia criminal como a conhecemos e como ela deve ser? O que é isso senão a fragilização considerável da ampla defesa e do contraditório e, com ela, a do direito fundamental à prova?”, questionou.
Camargo também criticou a ampliação no rol de possibilidades de nomeação de peritos “ad hoc” previsto no relatório. “A proposta do deputado João Campos admite que qualquer um que tenha ‘experiência’ em uma determinada área possa fazer o que se cunhou no texto de perícias ‘mais simples’. Primeiro que é controverso afirmar haver perícia mais simples; segundo que esse juízo de valor, se for feito, deveria ser feito pelo chefe da unidade de perícia oficial e não pelo delegado, que não têm o conhecimento científico sobre as particularidades e peculiaridades dos exames.”
O presidente da APCF também sugeriu ajustes no trecho que trata sobre vestígios digitais. “Da forma como se encontra o texto, está se criando um novo tipo legal de prova, dissociada da prova pericial, o que poderá ficar fora do escopo do necessário e imprescindível trabalho científico, isento e imparcial e qualificado dos peritos oficiais”, apontou.
“Os peritos oficiais não estão aqui pedindo novas prerrogativas. O que estamos pedindo é apenas que se mantenham aquelas que já possuímos e, mais que isso, que não se extingua perícia oficial, sob risco de grave prejuízo a um dos direitos fundamentais do cidadão, o direito à prova e também ao julgamento justo do processo penal”, ponderou Camargo.
“Não há dúvida que devemos buscar um novo CPP moderno e eficiente, mas não há espaço para que, nessa busca e em pleno século 21, seja perdida a oportunidade de se valorizar e consolidar o emprego da ciência na persecução penal, sob pena de construirmos um código que traga insegurança jurídica, impunidade e, tão ou mais grave, injustiças, sobretudo aos menos favorecidos”, finalizou Marcos Camargo.
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